Os magistrados do Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba (13ª Região), tanto no Primeiro quanto no Segundo Grau, têm, nos casos onde sua aplicação é pertinente, utilizado como base o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. O documento foi criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para orientar a magistratura no julgamento de casos concretos sob a lente de gênero para que casos de violência contra a mulher sejam tratados de forma diferenciada.
O juiz do trabalho André Machado, que é um dos coordenadores do Comitê de Igualdade de Gênero, Raça e Diversidade do TRT-13, afirmou que a magistratura em geral deve aderir a esse Protocolo, que se inspira em normas constitucionais e infraconstitucionais, além de outras de Direito Internacional, todas asseguradoras da isonomia entre homens e mulheres no mercado de trabalho.
“O Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ é uma poderosa ferramenta que fornece ao operador do Direito elementos e técnicas para entender a vulnerabilidade das mulheres em uma sociedade machista e sexista, que adota uma equivocada divisão sexual do trabalho e, assim, conduzir a instrução processual e o próprio julgamento na busca pela equidade de gênero, a inclusão e o combate ao preconceito”, frisou.
Comentários sexistas
Um exemplo recente de seu uso em um julgamento foi feito pelo juiz substituto da 11ª Vara do Trabalho de João Pessoa, George Falcão. De acordo com os autos do processo, uma funcionária de uma instituição bancária alegou ter sofrido assédio moral de um chefe do sexo masculino. Segundo relatou a trabalhadora, durante as reuniões, que contavam com colegas de outras agências, além das cobranças específicas de trabalho, o chefe disse para “usar batom para não ficar com cara de lavadeira” e que promoveria um homem pois “ele não precisa levar filhos ao médico”.
“Há claro tratamento discriminatório em relação às mulheres no comentário patronal que sugere priorizar empregados sem filhos. O fato ocorrido nada mais é do que uma faceta do sexismo no trabalho, ou seja, um conjunto de preconceitos e discriminações que se baseiam no sexo ou na orientação sexual. Ao que tudo indica, para o empregador, a possibilidade de gravidez de suas empregadas é avaliada como uma desvantagem competitiva”, argumentou o magistrado, ao citar o protocolo de julgamento do CNJ.
Em relação aos comentários sobre a aparência da funcionária, o juiz George Falcão entendeu ser uma tentativa de objetificação da mulher. “Ao incentivar que a reclamante deveria colocar batom, seu superior hierárquico, praticando assédio moral em sua forma mais sutil e velada, põe em dúvida inclusive sua capacidade intelectual, colocando-a em posição inferior. A mulher passa a ser, no ambiente de trabalho, objeto de sedução com fins competitivos, como se a beleza feminina fosse instrumento para impulsionar o batimento de metas. Esse arranjo sexista na relação empregatícia não pode, contudo, ser naturalizado”, pontuou.
Para avaliar este aspecto do caso, o magistrado usou como base, além do Protocolo, a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, da qual o Brasil é signatário, e o Decreto nº 9571/2018, que institui as “Diretrizes Nacionais sobre Empresas e Direitos Humanos”. Após a análise, entendeu que a bancária foi vítima de assédio moral do tipo vertical, deferindo indenização por dano moral no valor de R$ 25 mil.
Segundo Grau também usa Protocolo
Os casos julgados pelos desembargadores do TRT-13 também são analisados sob a perspectiva de gênero, em conformidade com o que preconiza o CNJ. Em um voto da desembargadora Herminegilda Leite Machado, vencedor em um processo de relatoria do desembargador Paulo Maia, a funcionária alegou sofrer assédio moral de um colega de trabalho, ouvindo expressões capacitistas devido a sua deficiência, e que a supervisora e gerente, mesmo diante de reclamações feitas pela vítima, nada fizeram para evitar o constrangimento.
Em seu voto, a desembargadora argumentou que a testemunha levada pela funcionária descreveu em riqueza de detalhes o assédio cometido, tendo inclusive presenciado o fato. Além disso, a magistrada enfatizou que os depoimentos das testemunhas demonstram que o acusado era habituado a fazer “brincadeiras” no ambiente de trabalho.
“Em casos como esse, ou seja, trabalhadora mulher e deficiente física, contratada como PCD e ofendida por um colega de trabalho por essa condição, é fundamental observar as premissas do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, tornadas obrigatórias pela Resolução CNJ nº 492/2023, bem como da Convenção nº 190 da OIT, que reconhece o direito de todas as pessoas a um mundo de trabalho livre de violência e assédio, incluindo violência e assédio com base em gênero”, analisou.
Para ela, o caso enseja a condenação e o pagamento de indenização por danos morais. “Basta um exame de empatia para aferir que chamar alguém de aleijada e reproduzir a sua deficiência física no local de trabalho, como fez o agressor, ofende a dignidade da pessoa humana, mesmo que o fato tenha ocorrido apenas uma vez, o que nem foi o caso, como se pode extrair do relato da testemunha da reclamante”, frisou.
Processo no Primeiro Grau: 0000747-66.2023.5.13.0030
Processo no Segundo Grau: 0000031-60.2023.5.13.0023
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 13ª Região Paraíba